Páginas

terça-feira, 1 de outubro de 2019

de Sabrina Telles
Quando, em pé, por entre vias
Escrevo na tentativa desesperada de que estas palavras,
quaisquer que venham,
façam qualquer sentido
após serem expulsadas de mim.
Desculpem-se pelos transtornos, estamos trabalhando para melhorar as chegadas.

Chego, dessa vez, para deixar que os dedos soltos construam,
com os ensinamentos deixados pelas superfícies nas quais deslizaram
- e os deslizes permanecem na memória latejante das suas pontas -,
algum passo, algum compasso
que não seja descartável
que seja mais que só aceitável,
que movimente cabelos e tecidos,
que distraia dores com sorrisos,
que ressoe, em cordas e couro, o nosso ritmo
pra "fazer com que fique bom, outra vez, o nosso cantar",
dissolvendo contrários dizeres,
isentando os nossos quereres,
ecoando o melhor que há no sim
Enfim.
Desculpem-se pelos transtornos, estamos trabalhando para melhorar as cadências.

A beleza quase que irretocável dos re.encontros
faz com que os instantes cotidianos
sejam todos eles re.colhidos
e guardados,
com um cuidado sincero
vindo do excesso de afeto que sente por eles
e por cada elemento que os envolve:
cada cor, luz, ideia, cada textura:
eles não são frágeis, nem fugidios,
Pois chegam como quem vai se demorar um cado,
E chegam todos com algo de cura,
anunciando para os que deles destoam
que eles já podem ir,
- que já deveriam ter ido -,
cada vez mais, com mais silêncio,
cada vez mais, com menos dor.
E, com constrangimento
de árvore quando descobre que nem todos os seus frutos servem mais,
por entre folhas, eles vão se despedindo.
Desculpem-se pelos transtornos, estamos trabalhando para melhorar as partidas.

Os gostos se apresentam como eles sempre quiseram ser
e nem sabiam como, nem o quanto,
depositando a crença de que meu paladar não se iluda.
E, se for assim,
quero o gosto real da ilusão,
- e do dendê, da cana, 
do boldo, do cravo, dos chocolates, da canela e do café -
como se não trouxesse perda, só vontades,
como se não fosse engano, e sim tentação,
como se viesse apenas dos desejos e da intuição.
Quero estar inteira,
Alerta.
Desculpem-se pelos transtornos, estamos trabalhando para melhorar os avisos.

Quero que os dias se adiantem para que se re.modele outra coisa
- de novo,
(quero viver esse resultado,
quase fingindo que há resultado,
quase desconsiderando que sei que é sempre processo,
que é sempre cíclico)
com a mesma vontade como quero que o Tempo se arraste
para dar tempo
de arrastar o Tempo
para que você não precise ter ido.


Quero ter o Tempo em minhas mãos
para que eu possa repousá-lo nas suas mãos
como quem carrega um encanto,
como quem entrega um sagrado,
para então cuidar dele: abraçar ele, dançar com ele, deitar com ele, re.virar ele, re.montar ele,
re.encaixar ele, sem pressa, em cada vida em nossos dias.
Desculpem-se pelos transtornos, estamos trabalhando para melhorar os sentidos,
Para saber quais sentidos.
Para resgatar os motivos
- e as origens -,
Para re.Gullar os modos

- e os instrumentos -,
Para re.lembrar dos caminhos.
Para re.criar os caminhos.
Para abrir caminhos.

Desculpem-se pelos transtornos,
Estamos trabalhando.

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2019

de Sabrina Telles


Sobre essências 
(De setembro de 2018 a fevereiro de 2019)

Não sei se já nomearam alguma vez e muito menos como o fizeram...
Cada vento que passa deixa se escapar em perfumes trazendo consigo segundos de suas pessoas, de seus espaços, de suas cores. Uma condição de memória incontrolável que me acompanha desde que recolho essa percepção olfativa, que cria todo um universo de possibilidades de sentir o passado, dando fuga a momentos que eu nem sabia que guardava tão bem, se tornando o elemento que traz mais vultos de nostalgia ao cotidiano, chega beira o absurdo.
E, em tempos como estes, nostalgia é coisa que não me abandona. 
Nostalgia é coisa que não abandona essas terras 
em tempos como estes.

Penso novamente nas tentativas de entender tempo e espaço que vão se dissolvendo com o decorrer do tempo e o trânsito entre espaços. Penso em como se desenhou essa história de que várias histórias nossas têm se repetido sem reciclagem, como se já não fôssemos outras,
como se não tivéssemos tentado evitar resgates.
"Será que vamos ter de responder pelos erros a mais, eu e você?"


Eu trago hoje coisas que sempre escaparam das minhas mãos...
"O que será que me dá? Que brota à flor da pele, será que me dá?"
Não sei se saberia tê-las de volta, deixá-las palpáveis, não sei traduzi-las. Da mesma forma também assim o somos: interno e externo são impossíveis de abarcar, de abraçar; temos o infinito em nós, assim como o tem os céus. E nele eu me apego para que o que construímos não nos venha com a obrigação do eterno; que não nos pegue pela vaidade de sermos tudo até que não sejamos nada; para que as pessoas que cheguem frágil se vão, deixando apenas vestígios; para que o que fique não nos limite, não nos conduza aos mesmos ciclos; para que tenhamos nós, para que sejamos nós; 
para que o silêncio seja escolha, seja retiro, não seja a única forma.
"Na tudu pásu ki bu da, m-sta lapidu na bo".

Penso em como,
quando chega,
sua presença recompõe minha presença parecendo que ela é de peças que estavam apenas postas em lugares distintos e que,
agora,
desse jeito que arruma,
fizesse mais sentido estar

na sala onde está 
e no mundo.
"A tua presença desintegra e atualiza a minha presença".
E assim fico: revisitada, remontada, reescrita.
E assim fica tudo que vejo: revisitado, remontado, reescrito.



(O mundo que escuto desde as janelas possui sua própria alegria triste que tem aquilo que apenas desvia do erro, 
que não é livre mas pode ser conduzido:
como um maquinista que deve saber parar quando outros o cruzam, 
mas que não pode sair dos trilhos.
Conheço ele pelo cheiro.)

Encontrar Neste Blog